Todos temos direito à qualidade de vida…

Basta de artifícios!

 

A população de Vila Velha de Ródão e os seus legítimos representantes estão carregados de razão e têm a legitimidade para lutar, com todos os meios e de manifestar a sua indignação, contra a pouca vergonha que tem sido a abordagem por parte das autoridades ambientais e governamentais ao problema da Centroliva, atualmente denominada Bioenergy, uma empresa dedicada à produção de energia elétrica através da combustão de biomassa (bagaço de azeitona e resíduos florestais), localizada em Vila Velha de Ródão. Há demasiado tempo que esta tragicomédia se desenrola, sempre com o mesmo resultado: condenações pelas autoridades ambientais e pelos tribunais, interposição de recursos. Quanto a consequências, nada! Podem continuar a laborar e a poluir descaradamente.

Tudo fica sempre na mesma. Mas nós, os residentes, exigimos poder circular pelas ruas com a máscara que se impõe mas que, lamentavelmente, também tem de servir para minimizar os efeitos do mau cheiro, do fumo persistente, empestado com odores pútridos do bagaço de azeitona e de outras “massas” designadas por BIO, que afrontam quem sai à rua para cumprir as suas rotinas, para praticar desporto, para conviver… especialmente para quem reside na parte baixa de Vila Velha de Ródão.

Lamentavelmente, todos compreendemos e desconfiamos dos motivos que atrasam a resolução do problema, porém episódios desta natureza repetem-se pelo país fora, curiosamente, quase sempre nos territórios do interior onde a opinião, leia-se o VOTO, dos residentes pouco conta. Contra esta idiossincrasia, infelizmente, já estamos mais do que vacinados, o que não conseguimos entender é como uma decisão que deveria decorrer, com toda a naturalidade e celeridade, da aplicação da LEI, não é levada às suas consequências pelas autoridades, cumprida pela referida empresa e adequadamente fiscalizada pelas entidades competentes.

Por isso perguntamos:

A obrigatoriedade da instalação dos meios que colocam as emissões das empresas dentro dos parâmetros legais que um Estado define é assim tão fácil de contornar?

O respeito pelos valores da saúde pública e o cumprimento das diretivas ambientais é tão difícil de fiscalizar e de fazer cumprir pelas nossas autoridades?

Quem nos ajuda a explicar isto?

“Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra diz que existiram descargas poluentes, mas não ficou provado que eram “suscetíveis de causar danos substanciais para o ambiente” [5 de abril de 2021] https://www.esquerda.net/artigo/poluicao-no-tejo-gestores-da-centroliva-nao-vao-julgamento/73637

Então que produtos compunham essas descargas e por que motivo foram levantados tantos autos de contraordenação?

Vamos recordar um breve, mas elucidativo, relato dos factos:

Jornal Reconquista, 30/09/2015 - Câmara aperta cerco à Centroliva

Luís Pereira [presidente da C. Municipal de Vila Velha de Ródão] avisa que as autoridades não estão disponíveis para "pactuar com estes incumprimentos". Empresa garante colaboração.

Jornal Reconquista, 11/03/2017 - Centroliva encerrada por incumprimento ambiental

A empresa que se dedica à produção de energia elétrica a partir da combustão de biomassa "não fez os investimentos com que se tinha comprometido há mais de um ano".

A Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional do Cento anunciou que vai encerrar a Centroliva em Vila Velha de Ródão. A empresa que se dedica à produção de energia elétrica a partir da combustão de biomassa (bagaço de azeitona, estilha e resíduos florestais) "não fez os investimentos com que se tinha comprometido há mais de um ano com o Governo, a Câmara Municipal de Vila Velha de Ródão, a Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional do Centro (CCDRC) e outras entidades públicas, e que visam instalar sistemas de tratamento de efluentes gasosos, obrigatórios por lei", diz a CCDRC em comunicado.

A mesma fonte fala em falhas de apresentação de relatórios de autocontrolo e incumprimentos em sete anos.

Jornal Reconquista, 11 de outubro, 2018

O Ministério Público afirma que “no inquérito iniciado em junho de 2017, apurou-se que, entre maio de 2017 e janeiro de 2018, em pelo menos oito ocasiões, na execução de plano delineado pelos arguidos singulares em representação e no interesse da sociedade arguida, foram por esta diretamente lançadas nas ribeiras de Lucriz e do Açafal as águas residuais provenientes da extração física de óleo de bagaço de azeitona”, tendo como consequência “a diminuição significativa da quantidade de oxigénio nas respetivas águas e o aumento elevado dos componentes químicos, não só nas mencionadas ribeiras, mas também no rio Tejo, do qual aquelas são afluentes, tendo prejudicado gravemente a fauna e flora neles existentes e impedindo a usufruição do meio hídrico afetado”. Neste inquérito, o MP foi coadjuvado na investigação pela Polícia Judiciária (PJ), Guarda Nacional República (GNR), Inspeção Geral da Agricultura, do Mar, do Ambiente e do Ordenamento do Território (IGAMAOT) e Agência Portuguesa do Ambiente (APA).

Jornal Reconquista, 15/03/2018 - Centroliva: Populares exigem intervenção das autoridades

Um grupo de cerca de 600 munícipes de Vila Velha de Ródão apresentou um abaixo-assinado que exige a intervenção efetiva das autoridades ambientais na empresa Centroliva.

Jornal Público, 16 de abril de 2018

A Agência Portuguesa do Ambiente (APA) decidiu aplicar a sanção de encerramento da unidade industrial de secagem e extração de óleo de bagaço de azeitona da Centroliva, com sede em Vila Velha de Rodão, durante três anos, com base nos factos dados como provados nos processos de contraordenações, referentes a situações registadas entre 2012 e 2017, verifica-se que a empresa "persiste, recorrentemente, em manter um comportamento ilícito, procedendo a descargas na linha de água sem licença".

Jornal Público, 19 de abril de 2018

O ministro do Ambiente, confirmando a decisão da APA, afirmou, numa visita a Vila Velha de Ródão, que a Centroliva não tem condições estruturais para funcionar e que, por esse motivo, foi decretado o encerramento da fábrica.

Ainda haveria mais registos desta natureza para enumerar, mas o referido já é suficientemente elucidativo.

Vale a pena questionar, uma vez mais:

Onde se enquadra o papel do Estado no assegurar do bem-estar das populações, o direito à qualidade do ar que respiramos, a preservação dos cursos e água e dos ecossistemas?

Não compete aos tribunais zelar pelo cumprimento da lei que, em primeira e última instância, deve estar ao serviço dos cidadãos, dos seus direitos fundamentais e da defesa do território?

As lacunas da lei dão uma grande ajuda… “O Público teve acesso ao acórdão do TRC, que não tem em conta o historial de poluição da empresa. De acordo com fonte da Inspeção-Geral da Agricultura, do Mar, do Ambiente e do Ordenamento do Território, a questão do “dano substancial” é referente à ausência de critérios legais para delimitar os conceitos vagos e indeterminados na definição de crime ambiental. Só 6% das denúncias ambientais chegam a julgamento”. [5 de abril de 2021], https://www.esquerda.net/artigo/poluicao-no-tejo-gestores-da-centroliva-nao-vao-julgamento/73637

Afinal os crimes existem e nem é muito fácil “varrê-los para debaixo do tapete”, o problema parece ser apenas uma questão de falta de critérios, de indicadores de medida… “conceitos vagos e indeterminados”.

Haja paciência e decoro! então por que esperam? Mudem a lei, melhorem-na e acabem de vez com esta pouca vergonha que descredibiliza as autoridades e o Estado, desvaloriza o território, enfraquece a democracia e escancara as portas a todo o tipo de indesejáveis, com discursos de moral duvidosa, mas com algumas verdades à mistura.

A dura realidade que temos em Vila Velha de Ródão, é esta: a atividade da Centroliva - Bionergy, suspensa no passado mês de março em virtude de desconformidades detetadas numa inspeção em conjunto da Direção-Geral de Energia e Geologia, da Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional do Centro, da Agência Portuguesa do Ambiente e da Autoridade Nacional de Emergência e Proteção Civil, foi sol de pouca dura e as chaminés voltaram de novo a lançar os efluentes gasosos para a atmosfera (os mais visíveis). Tudo ficou na mesma, uma vez mais!

Entre coimas e recursos a “procissão da vergonha” vai fazendo o seu caminho. Não se ouvem os foguetes, mas a festança é uma realidade, vê-se ao longe, inspira-se a fumaça densa. As promessas, essas, continuam por cumprir.

Precisamos deste tipo de unidades industriais? Acreditamos que sim pois o enorme aumento da produção olivícola do país assim o impõe, mas então posicionem-nas em locais adequados e mais afastados dos aglomerados populacionais e, sobretudo, exijam o recurso a tecnologia adequada, pois há financiamento para isso, mas respeitem as populações, a sua saúde e a sua qualidade de vida, mas também a dinâmica de empresas de outros ramos, que são claramente prejudicadas.

Deste vergonhoso folhetim resta-nos o compromisso, a capacidade de dar a cara por esta luta que o município de Vila Velha de Ródão, na figura do seu presidente Luís Pereira e da Assembleia Municipal, têm revelado em todo este processo e que não mostram sinais de desistir desta luta pelos interesses do concelho e pela qualidade de vida dos residentes, aos quais o Estado e a justiça têm manifestado um total alheamento e a incapacidade de dar a resposta que nas sociedades modernas se exige. 

Lamentavelmente, não são suficientes os abaixo assinados legitimados pela população; de nada servem as deslocações de ministros, deputados e entidades ambientais, sessões em tribunal, reportagens televisivas.  

O que nos resta enquanto cidadãos, desistir e abandonar estas terras?

Não! Mas vamos ter que dizer ainda mais alto, Basta! Poucos votos não representam Menores Direitos.

Somos residentes e somos resilientes, criamos os nossos filhos no interior, desenvolvemos a nossa atividade económica e científica nos territórios de baixa densidade, como gostam de nos classificar, constituímos uma reserva de qualidade, de autenticidade deste país que teima em tombar para a beira mar e que continua a ser despudoradamente alvo de abuso por “gente de referência”, que do adjetivo apenas sobra a pouca vergonha das negociatas, reveladas em audições parlamentares, mas sobejamente conhecidas e bem pagas por todos nós.

É triste constatar que neste país ,aos seus cidadãos, se impõe o cumprimento das obrigações legais e a cidadãos estrangeiros, a empresas e aos seus administradores, quase tudo se releva, com o prejuízo que daqui resulta mas que são sempre os mesmos a pagar.

A oratória pelo interior não pode esgotar-se nas palavras, em secretarias governamentais, supostamente descentralizadas. Tem que estar contida nos atos, nas decisões que protegem os direitos dos cidadãos e os valores do território. No respeito pela LEI, devidamente expurgada dos artifícios que beneficiam sempre os mesmos, aqueles que, de um modo feito de reminiscências feudais, muito levam e pouco deixam, escudados em teias de influência, na hipocrisia do discurso da “criação de postos de trabalho” e em escritórios de advogados que bem conhecem os alçapões destas leis que regularmente ajudam a criar.

Uma pergunta nos assalta a mente: Será que o dinheiro gasto com advogados para defender a empresa dos incumprimentos provados, não seria suficiente para dar cumprimento as exigências técnicas que a lei impõe e que a sociedade exige? Talvez sim, mas mais importante que o cumprimento parece ser a falta de respeito e o sentimento de impunidade que alguns teimam em cultivar.

Custa muito ver, passados 47 anos de regime democrático, que Portugal tem cada vez mais assimetrias, que os portugueses precisam de voltar a cerrar fileiras e a lutar por direitos consagrados mas que a lei não lhes consegue assegurar e que neste interior, que na nossa modesta opinião, repito, porque sabemos do que falamos, encerra os melhores e mais identitários valores culturais e patrimoniais, corremos o risco sério de definhar ainda mais e de deitar por terra investimentos efetuados para melhorar condições de vida, para estimular o conhecimento científico, a preservação e divulgação do património natural e construído, para gerar riqueza de uma forma sustentável e assim inverter este longo processo de “morte lenta” do Interior.

 

Mais recentemente, no dia 01 de julho, o grupo parlamentar do Partido Comunista Português (PCP), endereçou uma pergunta ao Governo sobre a atividade da empresa Centroliva em Vila Velha de Ródão, procurando obter esclarecimentos, nomeadamente sobre as medidas tomadas ou a tomar pelo Governo para assegurar a qualidade ambiental, quer do ar, quer da água, a proteção da saúde pública da população, bem como o cumprimento da legislação e a resolução dos problemas ambientais identificados, pergunta que se anexa para conhecimento e divulgação.